segunda-feira, 25 de abril de 2011

Memórias da Nossa Terra


António Maria e a sua extraordinária exposição na rua António José de Almeida em Santiago do Escoural.

Muitas são as memórias da nossa terra. Desta vez batemos à porta do nosso querido amigo e conterrâneo António Maria Jorge que é um Escouralense dedicado à sua Terra e pedimos-lhe que nos falasse da sua arte e das suas memórias.

António, é natural da freguesia de Santiago do Escoural, frequentou a escola primária onde concluiu o exame da 4ªclasse.

M.E.Sr. António seu pai era abegão; o que fazia um abegão?

A.M.-O meu pai fazia todos os utensílios de lavoura, desde a charrete, à aranha (transporte para duas pessoas), carros e carretas para transporte das sementeiras puxadas por mulas ou bois.

M.E.- Aprendeu essa arte com seu pai?

A.M.- Não, eu ajudava o meu pai sempre que podia, mas não segui a vida de abegão. Sai da escola com 12 anos e fui desmoitar sargaços com a minha mãe, acompanhei-a durante muito tempo nos trabalhos do campo. Um dia o Sabino pediu ao meu pai para me deixar ir fazer-lhe umas portas. O meu pai, mostrou-se receoso com tamanha responsabilidade, mas autorizou e terminei o trabalho com sucesso. Depois deste trabalho outras pessoas pediram os meus serviços, e foi assim que iniciei a minha vida de carpinteiro.

Como todos os jovens eu ambicionava seguir melhor destino e fui trabalhar para o caminho-de-ferro. Não fiquei lá por muito tempo, fecharam a cantina e fiquei sem ter onde fazer as refeições, não gostava de andar com o almoço às costas, e desisti. Decidi então dedicar-me à carpintaria a cem por cento. O marido da minha prima Lucinda Pisco O (Francisco Santos) tinha uma oficina, e já estava aposentado propus-lhe o seguinte negócio: eu trabalhava na oficina e dava-lhe uma percentagem sobre as obras que fazia.

Trabalhei nestas condições durante 2 anos.

Na mesma rua, o Chico Santos tinha uma casa para alugar, pedi-lhe que ma alugasse e fui trabalhar por conta própria. Aceitava todos os trabalhos que apareciam. O trabalho era tanto que tinha vários aprendizes. Naquela altura a moda era os reposteiros para as portas. Fizemos imensos.

Depois mudei a oficina para a Rua António José de Almeida, e ali também comecei a vender mobílias Também aceitei a representação de uma agência funerária e passei a fazer os funerais da Freguesia.

M.E.-O Sr. tinha uma sociedade com o seu irmão Jorge?

A-M.-Sim trabalhámos muitos anos juntos, a nossa firma tinha o nome dos (Alcobacinhas), mas passámos a ser conhecidos pelos irmãos (Marias).

Uns anos depois voltámos a fazer outra sociedade, passámos a oficina para a Rua Bernardino Machado e os novos sócios eram o António José Boleto e o Mário Canelas.

Foi dali que me aposentei.

M.E.- Então podemos dizer que encerrou aqui um ciclo da sua vida?

A.M.- Não foi bem assim, porque muitos clientes ainda me contactavam, e acabei por trabalhar algum tempo como empregado dos meus ex-sócios.

M.E- Os Marias eram muito alegres e brincalhões. Quer falar-nos desses momentos?

A.M, Naquele tempo qualquer coisa nos servia para fazer musica, tinhamos uma viola velha e os garfos e os pratos também serviam para fazer barulho. Tínhamos uma tipóia e faziam-se grandes paródias, que acabavam sempre em festa rija. Na nossa terra brincávamos muito. Formámos um grupo de amigos que se chamava (Os Unidos). Éramos 10 casais, fazíamos grandes pescarias e pelo Carnaval juntávamo-nos e fazíamos animadas brincadeiras nas ruas. As pessoas vinham todas à porta para nos verem passar.

Era tradicional no carnaval ter-se a mesa posta durante os dias de carnaval com o guisadinho de peru, o paio, e mais qualquer coisita que se pudesse arranjar, e muitos nos convidavam a entrar para tirar um petisco. Eram grandes momentos de alegria e amizade.

M-E.- Fez parte de um trio musical não foi?

A.M.- Sim era o Trio Falcão. Toquei no grupo dos 18 anos aos 30 e tal, Eu tocava bateria, o meu primo Almerindo Falcão tocava saxofone e o meu primo António Falcão tocava acordion.

Actuamos em muitos conselhos,” nos bailes.” Todos os anos nos contratavam para a festa de Santa Susana.

Íamos de bicicleta a podais até são Cristóvão e de carroça até à Caeirinha onde nos esperava um barco para atravessar o rio. Passávamos lá dois dias. Não tínhamos vocalista, era só música, mas as pessoas adoravam o Trio Falcão e solicitavam-nos. Sempre gostei de musica mas não aprendi com ninguém. Recordo-me de andar à mão do meu pai pelos meus 4 ou 5 anos atrás da Banda de Musica Escouralense, e já sonhava ser musico como eles. Tenho um acordion, continuo-o a ser o músico da terra, mesmo sem saber tocar a preceito. Colaboro com todos os que me solicitam - a Associação dos Amigos do Escoural, a Sociedade Recreativa, a Associação de Caçadores, a Associação de Reformados o Grupo Desportivo Escouralense, as escolas, e a Igreja.

Na Igreja sou eu que faço os andores para as procissões, e este ano também fiz o trono para os Reis do baile da pinha, que se realizou na Sociedade Recreativa Escouralense, no passado dia 9 de Abril.

M.E.- Mas o Sr. também tem muito talento como artesão.

A.M.-A minha imaginação nunca pára, estou sempre a pensar fazer alguma coisa. Sei que há fotografias das minhas obras na internet, mas não sou eu que as divulgo. São as pessoas que as apreciam e as colocam lá. Fico muito admirado quando alguém que eu não conheço me bate à porta solicitando os meus serviços. Acabei agora de fazer 150 cajadas para uma Universidade. Não faço disto um trabalho. Muitas das minhas obras até as ofereço a pessoas amigas.

M.E-O Sr. António tem muitas peças de Artesanato feitas e todas elas estão ligadas à cultura do Povo Escouralense. Nunca pensou fazer uma exposição dos seus trabalhos?

A.M. -Até gostava, mas como sabe tenho uma pequena dependência da minha casa onde exponho alguns dos meus trabalhos. A porta está sempre aberta e há sempre alguém de passagem que os aprecia, tiram fotografias e trocam algumas impressões comigo. É claro que sinto orgulho pelo meu trabalho.

M.E.-O Grupo de “Os Unidos”ainda existe?

A.M.- Ainda mantenho a tipóia, e fazemos lá uns petiscos de vez em quando. A tradição do cozido no dia do carnaval e a passagem de anos ainda se mantêm. Este ano juntei 32 pessoas na passagem de ano, mas a malta já não é tão animada como antigamente.

M.E.- Terminámos esta nossa conversa reafirmando e sublinhando a imagem de um NOTÁVEL Escouralense António Maria Jorge

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